SINDIFES FASUBRA Central Única dos Trabalhadores

Porque somos contra a EBSERH

16/10/2012
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Salvador, 28 de setembro de 2012

Das entidades abaixo assinadas

Ao Conselho Universitário da UFBA

Os Hospitais Universitários (HU) brasileiros vivenciam uma crise estrutural, a partir dos anos 1970. Dentre os aspectos estruturais da crise dos HUs, ressalte-se o conflito de interesses entre as categorias e corporações profissionais, bem como as divergências quanto aos modelos pedagógicos e operacionais da prática assistencial, de ensino e pesquisa, bem como a fragmentação do poder institucional e concepção ideológica divergente quanto ao papel social dos HUs.

Desde a década de 1980 que a análise da situação do nosso Hospital Universitário Professor Edgard Santos (HUPES) apontava as razões que conduziram para o estado de crise permanente do nosso e dos demais hospitais universitários brasileiros. Dentre estas, destacam-se: O agravamento da crise financeira; a incorporação interna de lógicas de mercado; modelo de gestão e administração anacrônicas; resistências de núcleos de poder à modernização   da   gestão   e   sub-remuneração   e   financiamento   através   de   convênios; indefinição do perfil assistencial; desarticulação com o Sistema Único de Saúde (SUS); insuficiente autonomia e gestão não profissional; indefinição na relação com o setor privado; incorporação de tecnologias e serviços sem critérios; baixa qualidade na prestação de serviços   e   nas   atividades   acadêmicas   (Plano   Diretor   do   HUPES,   1986),   além   de autonomização de serviços em “institutos”, “fundações” etc. e escassez de pessoas do quadro permanente para funções assistenciais, de ensino e pesquisa.

Ao longo de décadas, nenhuma formulação de política pelo governo federal e nenhum projeto foi apresentado e ou implantado visando a superação dessa crise estrutural.A partir das medidas de reforma do Aparelho de Estado brasileiro, iniciadas em 1995,e acentuadas na última década, as medidas assumidas para enfrentar o estado de crise permanente na produção de serviços de saúde se pautaram no repasse da responsabilidade de gestão, contratação e produção de serviços de saúde ao setor privado. Os modelos são muitos e todos testados, apontando que seus resultados são vantajosos para a lógica privada, mas não para a consolidação do SUS. São elas: Organizações sociais, formas diversas de tercerização (da contratação de mão de obra; da gestão; da produção de serviços meios, etc.); OSCIP etc. Nessa mesma direção é que se cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares pelo governo federal, em dezembro de 2011. A EBSERH é o tipo de solução dentro da lógica neoliberal, através de um arcabouço institucional e jurídico para satisfazer ao mercado e as “crises” econômicas do modo de produção capitalista.

A solução para a crise dos HUs inclui:

• aplicação   dos   princípios   constitucionais,   com   responsabilidade   pública   na prestação das ações e serviços de saúde;

• financiamento integral pelo ministério da Educação e pelo SUS, dado a sua finalidade específica;

• modelo de gestão político-técnico profissional, com autonomia, e com articulação entre os serviços;

• processo de trabalho articulado e contraposto à autonomia absoluta de alguns profissionais versus o controle rígido de outras categorias;

• práticas assistenciais geridas de modo integrado para atender ao perfil assistencial e aos resultados propostos;

• definição clara do perfil assistencial, articulado com sua finalidade e atendendo aos interesses do SUS local e regional;

• incorporação tecnológica a partir do perfil assistencial definido;

• quadro técnico-profissional bem estruturado, estável e qualificado;

• modelos de prática assistencial e de ensino integradas.

Assim,   as   entidades   que   assinam   esta   carta   vêm   apresentar   seus   argumentos contrários à decisão sobre o repasse da gestão dos Hospitais Universitários do Brasil e, em particular do complexo Hospital Universitário Prof. Edgar Santos à EBSERH.

1) A EBSERH é privatização de serviços públicos de saúde e do conhecimento produzido nos HUs

Ainda que genericamente o termo privatização designe as iniciativas que ampliam o papel do mercado em áreas anteriormente consideradas privativas do Estado, isto inclui não apenas a venda de bens e serviços de propriedade ou de prerrogativa exclusiva do Estado, mas, também, a liberalização de serviços até então de sua responsabilidade, como a educação, saúde e meio ambiente. Isso se faz pela desregulamentação e estabelecimento de contratos de gestão de serviços públicos por provedores privados (Leher, 2003). Assim sendo, e tendo como mediação da sua relação com a universidade o contrato de gestão, típico instrumento que atende aos interesses produtivistas do setor privado, este modelo de gestão ameaça os direitos sociais e o reconhecimento da saúde como direito de todos os brasileiros e DEVER do Estado, bem como contraria a Legislação do Sistema Único de Saúde (SUS).

2) A EBSERH desrespeita e reduz a autonomia universitária

Os hospitais universitários são estabelecimentos de ensino vinculados às universidades e responsáveis por formar profissionais de saúde, desenvolver conhecimentos e tecnologias e prestar   serviços   de   saúde   à   população,   regidos   pelos   princípios   da   reciprocidade   e solidariedade. Nesse sentido, o repasse  da  gestão  dos HUs para a  EBSERH,  com caráter jurídico  do  direito  privado, constitui-se um desrespeito à autonomia universitária, princípio garantido no artigo  207  da  Constituição.  Além  disso,  a EBSERH  é constituída de três conselhos, onde apenas o Conselho Administrativo é deliberativo e no qual, das nove cadeiras que o compõe, sete são indicadas pelo governo federal. Outro ponto importante é o a opção para a gestão local pela EBSERH, através de uma filial. Dentro da gestão empresarial, a filial é totalmente   subordinada   às   diretrizes   e   definições   da   sua   matriz,   de   modo   que   a   filial estabelecida no hospital universitário não terá autonomia para atuar no HU de acordo com as demandas e peculiaridades locais. Essa perda da autonomia, acentuada ao longo de décadas pela opção política de subfinanciamento dos HUs pelo governo, trará consequências negativas para o desenvolvimento das atividades de ensino, pesquisa e extensão, além da prestação de serviços. Com a gestão do complexo HUPES pela EBSERH desvincula-se, na prática, estes da UFBA.

Dado que a autonomia universitária está cada vez mais reduzida, basta analisar atentamente o modo e os critérios de avaliação dos cursos de graduação e pós-graduação e o que aconteceu com o financiamento da pesquisa que foi retirado das universidades e atribuído a outras instâncias (com o dinheiro que deveria ser destinado para as universidades), o que faltava solapar da autonomia universitária? O controle da produção de serviços de alta complexidade e da produção de tecnologias médicas e de saúde. A EBSERH faz isso.

3) A EBSERH ameaça o caráter público dos serviços de educação e saúde

Pautar o lucro dentro do serviço de saúde é deveras danoso à população. Não existe definição concreta de como o lucro que pode ser obtido pela EBSERH será aplicado. A forma de financiamento da empresa é flexível. No artigo 8º  da Lei que cria a EBSERH têm-se garantidas diversas formas de obter capital, admitindo inclusive financiamento por outras fontes e aplicações financeiras, as quais são formas de obtenção de lucro.

Não existe perspectiva de que o financiamento da União para a saúde aumente, o que nos leva a cogitar que a empresa se voltará para as outras formas de obtenção de recursos financeiros,   que   estão   totalmente   inseridas   na   lógica   do   mercado   e   que   exigirão   uma contrapartida que trará danos à função social do HUPES. Há, por exemplo, a possibilidade de realizar contratos e convênios com entidades nacionais e internacionais, incluindo as privadas, que podem ser parcerias preferenciais para uma empresa que deve manter seu equilíbrio econômico-financeiro para subsistir no mercado.

Quanto ao campo de pesquisa em que se constituem os HUs, este preocupa muito por causa do interesse do complexo industrial da saúde, em particular da indústria farmacêutica em se consolidar de vez dentro dos Hospitais, onde estão uma vasta quantidade e diversidade de “material humano”. O foco das pesquisas pode ser direcionado para objetivos que não de cunho social, pois essas, quando  voltadas para atender às demandas da população, apesar de sua importância, não tem a perspectiva mercadológica.

A EBSERH cria espaços de valorização do capital, com possibilidade de obtenção de outros recursos (que não o financiamento público). A obtenção de lucro líquido pela empresa permite que esta venda serviços, produtos, tecnologias etc. e a impulsiona para a captação de outros recursos para as atividades de ensino, assistência, pesquisa e extensão. Além disso, o ressarcimento pela saúde suplementar do atendimento prestado aos usuários do SUS com plano de saúde pode ser utilizado livremente pela empresa.

4)  A EBSERH é terceirização dos serviços de saúde e educação

Quando se argumenta que a implantação da EBSERH é uma terceirização dos serviços de saúde e educação, considera-se o princípio de que as atividades caracterizadas como “fim” do Estado, tais como a saúde e o ensino não podem ter sua gestão, equipamentos e pessoal transferidos para uma instituição privada. A constituição só permite que o Estado contrate tais instituições para desenvolverem atividades “meio”, como limpeza, vigilância ou determinados serviços técnicos da área de saúde (exames, consultas) com caráter complementar.

5)   A   EBSERH   contribui   para   o   desmonte   da   organização   dos   trabalhadores empregados pelo Estado, com a flexibilização dos vínculos de trabalho e extinção progressiva do concurso público

A principal justificativa do governo para a criação da empresa é a regularização dos mais de 26.500 funcionários terceirizados dentro dos hospitais. Dentro da lei está garantida a existência, por dois anos, do contrato precário feito pelas Fundações de Apoio. Outrossim, o problema dos atuais contratados não será resolvido pela EBSERH e só o será pelas próprias universidades, sem que nenhuma proposição tenha sido sequer formulada. No entanto, a contratação pela EBSERH dos futuros concursados, exclusivamente pelo regime da CLT, resultará na extinção da carreira do servidor técnico-administrativo dos HUs.

Outro problema é o vinculo de trabalho via a CLT, que na prática impõe a rotatividade dos profissionais de saúde, típica do setor privado, comprometendo a continuidade e qualidade do atendimento, bem como as demais atribuições de ensino, pesquisa e extensão dos HUs.

6) A EBSERH significa desrespeito ao controle social e à democracia universitária

Com a gestão via EBSERH, o complexo HUPES estará subordinado ao regimento da empresa, resultando na perda de espaços e mecanismos para uma gestão democrática, como o conselho gestor, e a consulta à comunidade na escolha do gestor do hospital. Não existirá controle social dentro desta empresa, o que desrespeita as diretrizes e princípios do Sistema Único de Saúde.

O desrespeito ao controle social é manifesto ao se desconsiderar a deliberação da 14a Conferência Nacional de Saúde, maior instância do controle social no SUS, realizada entre 30 de novembro e 04 de dezembro de 2011: “Rejeitar a criação da Empresa Brasileira de serviços Hospitalares (EBSERH), impedindo a  terceirização  dos  hospitais  universitários e  de  ensino federais” (Relatório da 14ª CNS, Ministério da Saúde, 2012).

Por fim, os signatários desejam também manifestar seu descontentamento com o modo antidemocrático como as decisões sobre a adesão à EBSERH estão sendo tomadas dentro e fora da UFBA.

Por duas vezes o tema da EBSERH foi pautado no CONSUNI, mas não foi discutido. Após a greve, foram programadas apenas duas reuniões deste Conselho sobre o assunto, uma para discussão e outra para decisão.

Lideranças   dos   três   segmentos   da   UFBA,   estudantes,   funcionários   técnico-administrativos e professores, tem reivindicado, sem sucesso, à Reitora e sua equipe a realização de uma agenda de debates sobre o tema.

Seria possível supor que a discussão até o momento tenha dado oportunidade de participação   a   todos   os   interessados,   considerando-se   que   representantes   das   diversas Unidades da UFBA têm assento no CONSUNI, e que esses representantes devem ter discutido o tema em suas respectivas Congregações. Esse ciclo democrático virtuoso deve ter se iniciado em cada Unidade com a discussão dos representantes nas Congregações com seus representados.

No entanto, quem está acompanhando o processo de tomada de decisão sobre esse tema tão fundamental para a UFBA pode observar que não houve discussão ou esta foi insuficiente   em   várias   Unidades   e   Departamentos.   Além   disso,   as   decisões   em   várias Congregações têm sido tomadas com base em argumentações avessas a um ambiente de liberdade, ao se colocar que se deve aprovar a adesão porque não há alternativa. Como caracterizar um processo de decisão como livre e democrático, se, de início, a maioria dos debatedores defendem que só há uma decisão possível? Um agravante é que esta afirmativa categórica tem sido feita por membros dessas instâncias decisórias, muitos dos quais não tiveram   acesso   às   informações   sobre   o   tema.   Outro   agravante   é   que   membros   de Congregações de unidades de ensino fora da área da saúde mostram-se receosos de votar contrariamente aos votos daquelas da área da saúde, pressupondo, equivocadamente, que estas Unidades discutiram o tema mais detalhadamente e com maior propriedade.

Em várias unidades, as votações nas Congregações registram um número elevado de abstenções,   que   têm   sido   justificadas   pela   ausência   completa   de   discussão   nos Departamentos.

As   evidências  apontadas   acima  colocam   em   dúvida   o  caráter   democrático   das decisões até agora tomadas pelas instâncias decisórias da UFBA acerca da adesão à EBSERH. Essa situação é preocupante e compromete a legitimidade das decisões tomadas.

Assinam,

FAS – Fórum Acadêmico de Saúde da UFBA

DCE – Diretório Central dos Estudantes da UFBA

Comissão de Mobilização dos Docentes da UFBA

ASSUFBA Sindicato


Sistema Jurídico






  

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